Por Camila Borges
As plataformas digitais se popularizaram e possibilitaram para muitos trabalhadores a inserção no mercado, prestando serviços via Uber ou iFood, por exemplo. No entanto, os altos preços de combustíveis e as altas taxas retidas pelos aplicativos têm levado os trabalhadores a enfrentarem problemas para continuar com o modelo. Uma das alternativas que já tem sido adotada em alguns locais é a criação de cooperativas de plataforma – geridas pelos próprios prestadores de serviço – para suprir demandas por custos operacionais mais acessíveis.
O cooperativismo de plataforma nada mais é do que um modelo em que empresas que prestam serviços digitais seguem os princípios de cooperativas, com uma gestão mais democrática e uma distribuição igualitária da riqueza. É como se fosse um Uber gerido por motoristas, um iFood gerido por entregadores ou um Airbnb gerido por locadores.
Os prestadores de serviço de plataformas tradicionais não possuem os mesmos direitos que os trabalhadores formais, tais como hora extra, seguridade social ou limites de horas trabalhadas. Eles são atraídos pela ideia de serem empreendedores anônimos, mas acabam abrindo mão de vários benefícios. Esse fenômeno negativo é conhecido como “uberização do trabalho”, um sinônimo contemporâneo para a precarização do trabalho, com relações mais “flexíveis”, sem vínculo empregatício.
Carlos André Santos de Oliveira, diretor-executivo do Sistema Organização das Cooperativas do Brasil no Espírito Santo (OCB/ES), ressaltou os inúmeros benefícios que o cooperativismo de plataforma traz.
“As cooperativas de plataforma se diferenciam das empresas tradicionais de plataforma, cujas gestões e ganhos são centralizados em poucos indivíduos. As cooperativas podem contribuir para esse mercado ao ofertarem oportunidades de emprego, renda, produtos e serviços de maneira mais justa e sustentável, já que a premissa cooperativista é promover o desenvolvimento e o bem-estar coletivos”
Carlos André Santos de Oliveira, diretor-executivo da OCB/ESAlém disso, no aspecto mercadológico, podem ser ofertados produtos e serviços de maior qualidade e que atendam às exigências dos consumidores, que cada vez mais cobram das empresas relações de trabalho mais justas e compromisso com boas práticas ambientais. As cooperativas de plataforma poderão estimular a competitividade no setor, descentralizando o mercado e fomentando a economia e a retenção de riquezas locais.
Na prática
O modelo se desenvolve e faz sucesso em outros países, como é o caso da FairBnB, uma cooperativa de hospedagem gerida por anfitriões, hóspedes, convidados e empresários locais. A FairBnB já funciona principalmente na Holanda, Itália, Alemanha e Espanha e está em expansão. Com o objetivo de redistribuir a riqueza e gerar empregos, a cooperativa transfere 50% das taxas recebidas das reservas para projetos comunitários na área de acolhimento.
Outro exemplo popular é a Stocksy United, uma plataforma cooperativa de licenciamento digital fundada em 2013. Nela, 90% dos lucros excedentes da cooperativa são distribuídos de volta aos seus artistas e pagos de acordo com sua contribuição no total de vendas. A Stocksy revolucionou a ideia de bancos de imagem, pois criou uma plataforma online de propriedade coletiva de seus artistas-membros em que todos recebem taxas altas de royalties por seu trabalho.
No Brasil, uma das iniciativas ocorreu na cidade de Araraquara, no interior de São Paulo. A prefeitura municipal patrocinou o surgimento de uma cooperativa para auxiliar motoristas a lidar com o aumento da gasolina. A Coomappa opera por meio do aplicativo Bibi Mob. As tarifas começam em R$ 2,50 e a plataforma desconta apenas uma porcentagem de 5% a 7% para manutenção do software, repassando aos motoristas, em média, 95% da receita. É uma porcentagem cerca de 40% superior a outras plataformas. O Uber, por exemplo, desconta uma taxa que chega a 40%.
Em junho deste ano, foi iniciada uma movimentação também em Pelotas, Rio Grande do Sul, a fim de debater a criação de uma cooperativa para a região. A inspiração veio justamente da experiência de Araraquara. Alguns integrantes viajaram até São Paulo para conhecer melhor a iniciativa e discutir as diretrizes para a formação da nova cooperativa.